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Já era noite quando o tenente Pedro Aihara, na época com 26 anos, subiu numa cadeira de plástico improvisada na base do Corpo de Bombeiros, em Córrego do Feijão, para uma das funções que classifica como a mais desafiadora da carreira: dar notícias sobre as operações de resgate após o rompimento da barragem B1, em Brumadinho, a uma multidão formada por moradores e parentes de vitimas. Era o primeiro dia de uma missão que completa, nesta quarta-feira (20), 300 dias ininterruptos de buscas.
“Nossa responsabilidade de fazer comunicação que respeite as famílias e tenha contexto de levar informação e acolhimento também continua. (…) Cada vez que damos resposta a uma família, que encontramos alguém, a sensação de felicidade, de dever cumprido está sempre presente”, disse.
A barragem B1 se rompeu no dia 25 de janeiro. Até agora, 254 corpos foram identificados pela Polícia Civil. As buscas por dezesseis desaparecidos seguem sem data para terminar.
Pedro Aihara se tornou o rosto mais conhecido e referência do Corpo de Bombeiros para manter famílias de vítimas, comunidade e imprensa informados sobre as buscas da operação, que já é considerada a maior do país. O militar ficou em Brumadinho durante 21 dias ininterruptos. E voltou diversas vezes nos meses seguintes.
Por causa do contato direto com familiares de vítimas por tanto tempo, a criação de vínculos é inevitável, admitiu o tenente. “Tem quem ligue, quem mande cartas e quem me abrace em encontros por acaso. Já encontrei estas pessoas em shopping, centro espírita, aeroporto, jantando, em casamento”, falou.
Driblando a formalidade militar, foi em nome deste vínculo criado com familiares durante a operação em Brumadinho que o próprio tenente Aihara fez questão de comunicar o encontro de alguns desaparecidos. É o caso do corpo do jovem Robert Ruan, de 19 anos. Ele era funcionário terceirizado da Vale e ficou desaparecido por quase dez meses. Foi a 252ª vítima identificada. O corpo estava íntegro e com crachá.
“Tinha indício fortíssimo que era o Robert, pela área que foi localizado, pelos restos de roupas, pelo crachá. Tive a certeza de que era ele antes de ligar pra mãe, Iolanda. Avisá-la foi um compromisso que assumi”, contou.
A história da doméstica Iolanda de Oliveira, de 49 anos, sensibilizou Aihara, por ser o terceiro filho que ela perdeu. Três meses antes do rompimento da barragem, o irmão gêmeo de Ruan, Richard Oliveira, foi assassinado.
“Quando a conheci e ela me contou sua história, eu senti algo tão forte, mas tão forte, que sem pensar nem um pouco, olhei no fundo dos olhos dela e prometi que nós encontraríamos seu filho, o Robert. Prometi mesmo. Repeti, enfatizei, reiterei. Disse que um dia eu iria falar com ela novamente e dizer que a promessa estava cumprida para que ela não se esquecesse disso”, disse o bombeiro em post no Instagram.
O cuidado da corporação se estende a outras famílias, declarou o tenente. Reuniões semanais ainda são realizadas com os parentes das pessoas que continuam desaparecidas. Algumas chegam a acompanhar a atuação na área de buscas. “Todas as famílias que procuram, a todas elas, temos cuidado de mostrar o que está sendo feito”, afirmou.
Buscas continuam por tempo ininterrupto — Foto: Patrícia Fiúza / G1
“As pessoas falam muito que nós, bombeiros, somos heróis. A gente entende e recebe com carinho, mas se existem heróis, estes são os familiares que, mesmo diante deste choque de perder amigos ou parentes de uma maneira tão trágica, conseguem ressignificar sua vida”, concluiu.
Bombeiros contam com apoio de maquinário e tecnologia para buscas de corpos — Foto: Corpo de Bombeiros/Divulgação
Fonte: G1 Minas — Belo Horizonte –